terça-feira, 23 de outubro de 2012

A Trova na Terra Média



Pode-se dizer que o Trovadorismo foi a primeira forma de manifestação expressão literária da Língua Portuguesa. Ele surgiu no século XII, em plena Idade Média, na época em que Portugal estava no processo de formação da sua nação.
O marco inicial do Trovadorismo é a “Cantiga de Ribeirinha”, ou também chamada de “Cantiga da Garvaia”, que foi escrita por Paio Soares de Taveirós no ano de 1189. O ano de 1418 é o ano em que Fernão Lopes, funcionário da Coroa, foi nomeado Guarda-Mor da Torre do Tombo. Esse fato define, ao menos oficialmente, o fim do Trovadorismo, tendo em vista que Fernão Lopes viria a ser o protagonista de um novo comportamento literário em Portugal, o chamado Quinhentismo.

Cantiga da Ribeirinha
No mundo nom me sei parelha,   No mundo ninguém se assemelha a mim
Mentre me for’ como me vai,                    mim enquanto a vida continuar como vai,
Ca já moiro por vos – e ai!            porque morro por vós, e ai!
Mia senhor branca e vermelha     minha senhora alva de pele rosadas,
Queredes que vos retraia              quereis que vos retrate
Quando vos eu vi em saia!                       Retrate quando eu vos vi sem manto.
Mau dia me levantei,                      Maldito dia que me levantei
Que vos enton non vi fea!              E não vos vi feia

E, mia senhor, dês aquel di’,ai!    E minha senhora, desde aquele dia, ai!
Me foi a mi mui mal,                                   tudo me foi muito mal
E vos, filha de don Paai                 e vós, filha de Don Paio
Moniz, e bem vos semelha                       Moniz, e bem vos parece
D’aver eu por vos guarvaia,                      de ter eu por vós guarvaia
Pois eu, mia senhor, d’alfaia                    pois eu, minha senhora, como presente
Nunca de vos ouve nen ei             Nunca de vós recebera algo
Valia d’ua correa.                            Mesmo que de ínfimo valor.

A poesia do Trovadorismo tem forte intimidade com a música, pois era formada para ser cantada ou entoada, para ser acompanhada de instrumentos como a flauta, a viola, o alaúde, ou até mesmo com a presença de coro. Essas composições podem ser divididas em dois grupos: líricas e satíricas. Do primeiro grupo, são mais conhecidas e estudadas as Cantigas de Amigo e de Amor. Já do segundo grupo, as Cantigas de Escárnio e de Maldizer.
3.     Líricas

   Cantiga de Amigo

Nas Cantigas de Amigo, o emissor é a mulher, por isso se diz que o eu - lírico é feminino. Na verdade, nessas cantigas, o autor era homem, que se faz passar pela mulher que namora ou pela qual tem interesse.
Geralmente, nessas cantigas, a mulher pertence à alguma camada social menos culta e mais popular Os autores procuram mostrar a mulher dialogando com sua mãe, com algum elemento da  natureza(ramo, flor, árvore, fonte, lago, etc.), como se o seu namorado estivesse por perto, a ouvir suas juras de amor,  ou com uma amiga, sempre preocupado com seu amigo(namorado).
Em muitas composições, a água(ondas, mar, lago, fonte) admite forte conotação erótica, metaforicamente, uma vez que o relacionamento entre os namorados era, ou deveria ser íntimo. As Cantigas de Amigo, quase sempre nos mostra uma elaboração estética diferente, devido muito a sua origem popular, pois seus compositores não são nobres importantes, portanto, suas letras têm menor riqueza vocabular e normalmente se utilizam paralelismos e/ou refrões, bem como outos recursos que ajudam no “prolongamento” da canção, como a estruturação musical, tornando assim mais acessíveis ao leitor e ao ouvinte.

"Se sabedes novas do meu amigo,
aquel que mentiu do que pôs(3) comigo?
    ai, Deus, e u é?


Se sabedes novas do meu amado,
aquel que mentiu do que mi á jurado?
ai, Deus, e u é?
                                                                                                                       

Vós me preguntades polo voss’amigo?                                       
E eu ben vos digo que é san’e vivo(4)
ai, Deus, e u é?
                           
                                            

Vós me preguntades polo voss’amado?
E eu ben vos digo que é viv’e sano
ai, Deus, e u é?


E eu ben vos digo que é san’e vivo,
e será vosc’ ant’o(5) prazo passado(6).
ai, Deus, e u é?


E eu ben vos digo que é viv’e sano,
e será vosc’ ant’o prazo saído(7).
ai, Deus, e u é?"

    Cantiga de Amor
Nesta cantiga, o tema será a confissão amorosa do homem em relação a uma mulher, normalmente lamentando o seu sofrimento de amor (coita) perante a indiferença da mesma. Na cantiga de amor como é o homem que fala, costuma-se dizer que se trata de um eu lírico masculino.
A posição de inferioridade em que se é colocado o apaixonado, torna quase sempre a sua cantiga uma expressão do sofrimento amoroso, um lamento. Esse tipo de sentimento era chamado de coita. A persistência com que essa temática aparece nas Cantigas de Amor torna-as repetitivas. Não obstante, essas cantigas de amor foram o tipo de produção mais importante dentre as cantigas. Isso se deve ao fato de ter sido produzida por compositores ligados à nobreza, o que, quase sempre, garante uma estruturação técnica de melhor qualidade e uma maior riqueza no vocabulário. Além disso, ela se tornou uma das mais importantes, por se dirigir a um público mais culto.

         
"Tam grave dia que vos conhoci,
por quanto mal me vem por vós, senhor!
ca me ven coita, nunca vi mayor,
sen outro ben, por vós, senhor, des i
por este mal que mh’a mim por vós ven,
como se fosse bem, vem-me por em
gran mal a quem nunca o mereci.

Ca, mha senhor, porque vos eu servi,
sempre digo que sode’l milhor
do mund’e trobo pólo vosso amor,
que me fazedes gram ben e assy
veed’ora,  mha senhor do bon sen,
este bem tal se compr) en mi rre),
senon, se valedes vós mays per y."
    
Satíricas

  Cantiga de Escárnio

A Cantiga de Escárnio é uma composição satírica, em que se é criticado alguém a partir da zombaria, do sarcasmo, que é um traço típico da sátira. O escárnio pode ser identificado como uma sátira indireta, pelo fato de não ser muito contundente e por “encobrir” a agressividade através de uma ambiguidade.

 "Ai dona fea! foste-vos queixar
porque vos nunca louv’em meu trobar 
mais ora quero fazer un cantar
en que vos loarei toda via
e vedes como vos quero loar
dona fea, velha e sandia!


Ai dona fea! se Deus me perdon!
e pois havedes tan gran coraçon
que vos eu loe en esta razon,
vos quero já loar toda via;
e vedes qual será a loaçan:
dona fea, velha e sandia!


Dona fea! nunca vos eu loei
en meu trobar, pero muito trobei;
mais ora já un bon cantar farei
en que vos loarei toda via;
e direi-vos como vos loarei:
dona fea, velha e sandia!"

 Cantiga de Maldizer
As Cantigas de Maldizer se diferenciam das de Escárnio por apresentar sátira direita. A crítica sempre decisiva e clara usa ,muitas vezes, do baixo calão, das agressões verbais. Nessas cantigas, os nomes das pessoas satirizadas podiam aparecer ou não explicitamente nos textos.
As críticas feitas normalmente nessas cantigas referem-se a comportamentos políticos, sexuais, a compositores incapazes, a nobres traidores, a rivais amorosos, a pessoas comuns, profissionais ou proprietários pretensiosos, a mulheres de hábitos feios ou imorais, dentre outros temas.
Essas composições satíricas circulavam por lugares públicos, como colheitas, tabernas, feiras, periferias urbanas, caracterizando assim como uma literatura marginal, mas, mesmo por isso, de uma grande relevância histórica


"Ai, dona fea! Foste-vos queixar
que vos nunca louv'en meu trobar;
mas ora quero fazer um cantar
en que vos loarei toda via;
e vedes como vos quero loar:
dona fea, velha e sandia!

Ai, dona fea! Se Deus me pardon!
pois avedes [a] tan gran coraçon
que vos eu loe, en esta razon
vos quero já loar toda via;
e vedes qual será a loaçon:
dona fea, velha e sandia!

Dona fea, nunca vos eu loei
en meu trobar, pero muito trobei;
mais ora já un bon cantar farei,
en que vos loarei toda via;
e direi-vos como vos loarei:
dona fea, velha e sandia!"

5.Os principais autores do Trovadorismo foram:

·         D. Diniz 

·         João Garcia de Guilhade

·         Martim Codax

·         Paio Soares de Taveirós

(Isadora Morais de Ataídes)

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